Por que o ativismo acionário está mudando nos EUA
Por Juliana Schincariol para Infomey
Carl Icahn, um dos investidores ativistas mais emblemáticos da história, tornou-se sinônimo de confrontos públicos e estratégias agressivas para pressionar empresas a adotarem mudanças significativas. Ao longo de sua trajetória, protagonizou intervenções que mudaram rumos de companhias globais. Na Apple, pressionou por um aumento robusto no programa de recompra de ações; no eBay, defendeu a separação da PayPal para destravar valor; e na Netflix, cobrou eficiência operacional para maximizar retornos aos acionistas.
No entanto, a atuação de figuras como Icahn está mudando. Desde 2024, a imprensa internacional vem reportando uma transformação no ativismo acionário global. Veículos como o Wall Street Journal, a Reuters e o Financial Times destacam que o modelo tradicional de confrontos públicos e disputas por proxy voting — o processo pelo qual acionistas votam à distância para eleger conselheiros ou aprovar decisões estratégicas, muitas vezes por meio de campanhas intensas — está dando lugar a uma abordagem mais estratégica. A nova dinâmica é marcada por acordos discretos e cooperação entre investidores e conselhos de administração.
Segundo o WSJ, o ativismo está se tornando “mais institucionalizado, focado em mudanças construtivas e estratégicas, e menos em ganhos imediatos”. A Reuters aponta para uma crescente preferência por acordos privados em vez de confrontos públicos, que minimizam custos e preservam reputações. O Financial Times reforça essa tendência, afirmando que “a paz parece estar prevalecendo no campo do ativismo, com mais negociações silenciosas e menos batalhas públicas”.
Mesmo com essa mudança de direção, é importante reconhecer que as campanhas de proxy voting não deixaram de acontecer. Em março de 2025, a Kenvue, gigante de bens de consumo, cedeu à pressão do fundo Starboard Value e nomeou três novos executivos. Meses depois, a gestora Engine Capital foi às manchetes ao exigir cortes de custos e até cogitar a venda da Avantor, empresa de ciências da vida.
Essa guinada é explicada por custos elevados de campanhas públicas, riscos reputacionais para ambos os lados e pela constatação de que acordos diretos tendem a gerar resultados mais rápidos e previsíveis. Além disso, mudanças regulatórias e o aumento da participação de investidores institucionais com estratégias de longo prazo incentivam a resolução de divergências fora dos holofotes. O resultado é um ambiente em que gestoras e empresas preferem costurar compromissos de governança e ajustes estratégicos por meio de diálogos reservados, em vez de travar disputas abertas que podem se arrastar por meses.
No Brasil, adversamente, esse tipo de confronto público sempre foi raro,mas por razões distintas dessa mudança de tendência nos EUA. A estrutura acionária concentrada entre famílias, fundos de pensão como a Previ ou entes estatais mantém as decisões corporativas mais reservadas. O termo “ativismo” também carrega uma percepção conflitiva no Brasil, frequentemente associado a embates judiciais ou disputas hostis, o que leva muitos gestores a adotar nomenclaturas mais neutras, como “engajamento com empresas” ou “diálogo construtivo”, para descrever algumas iniciativas semelhantes.
A evolução do ativismo reflete os diferentes estágios de maturidade da governança corporativa em cada mercado. Nos Estados Unidos, com um ambiente regulatório consolidado e um mercado de capitais profundo, o ativismo tem migrado para formatos mais sofisticados, focados em diálogo estratégico e cooperação, sem perder a relevância do investidor minoritário na pressão por resultados.
No Brasil, embora o ativismo público seja raro, o investidor minoritário mantém um papel fundamental. Ao contribuir para o fortalecimento da governança e a mitigação de riscos, ele impulsiona a construção gradual de um mercado mais transparente e alinhado com as melhores práticas globais, demonstrando que, mesmo em mercados emergentes, o acionista minoritário pode fazer diferença real nas estratégias das companhias.