Artigo 04/02/2024

Panorama da remuneração no Brasil e no mundo

Considerada um fator relevante para alinhar interesses de acionistas e da administração de uma companhia, a remuneração de executivos foi alvo de escrutínio de investidores nas assembleias de 2023 na Europa, Estados Unidos e também no Brasil.

Um levantamento da Ânima Comunicação em Governança mostra como acionistas de companhias que compõem o Ibovespa discutiram o tema na temporada de 2023, enquanto se preparam para a próxima rodada de reuniões, até o fim de abril.

No Brasil, a remuneração de administradores foi aprovada com unanimidade em quatro companhias e reprovada em uma, entre as 83 empresas que fazem parte do principal índice da B3. A maioria das propostas foi aprovada por maioria absoluta, Em 20 empresas, houve rejeição por mais de 10% dos votantes na assembleia.

“O tema remuneração de administradores é um dentre os mais importantes na vida de uma companhia e no seu relacionamento com acionistas e investidores. No mundo é uma questão mais pacificada e corriqueira, em que investidores buscam um relacionamento mais próximo para entender melhor a composição da remuneração”, diz o advogado Renato Vetere, sócio do VDV Advogados e especialista em governança.

Esse relacionamento próximo, em alguns casos, traz excelentes benefícios, com eventuais ajustes na estrutura da remuneração e seus valores. Na maioria dos mercados de capitais, continua o especialista, não se admite a opacidade ou informações incompletas. “Cada vez mais é exigida a total transparência dos atos da administração, especialmente quando se trata de companhias abertas. Nesse sentido, muito por iniciativa de investidores e da própria CVM é que tem sido buscada a sua evolução, com resultados visíveis”, conclui.

Na Europa, a consultoria Georgeson analisou os sete maiores mercados da região: Reino Unido, Alemanha, França, Holanda, Espanha, Suíça e Itália . O tema salarial se mantém como a resolução mais contestada nas assembleias destes países,apesar do leve recuo frente a 2022. O assunto recebeu pelo menos 10% de oposição em 36,1% das assembleias, ante 37,1% um ano antes. A Suíça teve a maior proporção de resoluções contestadas (68,4%).

Entre as empresas do S&P 500, nos Estados Unidos, a temporada de 2023 ficou marcada por 2,5% das companhias que rejeitaram as propostas ante 4,6% em 2022. Conhecido como “say on pay”, o mecanismo foi estabelecida após a lei Dodd-Frank, em 2010, para permitir que a opinião dos acionistas fosse ouvida sobre o nível e estrutura da remuneração dos executivos, assim como promover o engajamento das companhias e seus acionistas considerando um fator importante de governança corporativa.

Os principais executivos das companhias do índice S&P 500 ganharam, em média, US$ 16,7 milhões em 2022, 272 vezes mais do que a mediana dos funcionários, um declínio em relação ao ano anterior, de acordo com uma reportagem da Reuters. O pior desempenho das ações foi responsável pela queda, já que a remuneração está muitas vezes ligada, em parte, aos retornos dos investidores.

No Brasil, considerando as empresas que fazem parte do Ibovespa, essa diferença, em média, foi de 297,5 vezes, segundo dados da Ânima. Esse tipo de comparação passou a ser possível a partir de 2023, quando entraram em vigor as novas regras da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) para o formulário de referência - um dos principais documentos entregues anualmente pelas companhias de capital aberto.

A nova regra passou a exigir das companhias mais transparência com relação a dados ambientais, sociais e de governança, incluindo informações raciais. Na mais recente mudança, por meio da resolução 198 incluiu um campo específico para divulgação de informações sobre o contingente de pessoas com deficiência (PcD).

“Sobre o papel do Conselho em relação aos investidores, espera-se transparência e equilíbrio nas decisões e abertura com todos os stakeholders da empresa, não só para transmitir confiança como também para questionamentos e sugestões”, afirma o conselheiro independente e especialista em governança corporativa, Geraldo Affonso Ferreira.

Além disso, investidores institucionais e assets têm o dever fiduciário de zelar pelos recursos de seus clientes. Esse engajamento na gestão das empresas investidas é o chamado stewardship, prática adotada em mercados desenvolvidos, mas ainda pouco difundida no Brasil. “O Código Brasileiro de Stweardship existe desde 2021 e a tendência é que esse tema cresça em importância por aqui também”, afirma Ferreira.