Clarissa Lins para Boardwise da Ânima Comunicação em Governança
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Por Larissa Caetano
A transição energética tem muitos desafios e ainda não há clareza em relação à sua trajetória futura. Ainda que existam incertezas, o progresso da tecnologia e algumas mudanças globais são aliadas no combate às mudanças climáticas, acredita a fundadora da Catavento Consultoria e conselheira de empresas, Clarissa Lins. Na visão da economista, algumas áreas estão bem avançadas e os Conselhos de Administração podem contribuir nas discussões relativas aos impactos no mundo corporativo.
Em regiões onde políticas públicas não estão claramente estabelecidas, o ‘board’ se depara com um ambiente não necessariamente propício. “É uma avenida que depende de vários fatores. O avanço depende do setor de atuação, do desenvolvimento de tecnologia, de um produto que atenda a uma exigência de baixo carbono, do cumprimento de regulação mais restritiva”, disse em entrevista ao Boardwise. Confira os principais trechos dessa conversa:
Boardwise: Como deve ser o papel do Conselho em orientar as companhias sobre a agenda ESG?
Clarissa Lins: O maior desafio é entender de que forma eventuais questões ESG se conectam à estratégia de negócios, seja oportunidade ou risco. A avaliação, tanto do ambiente de negócios quanto de estratégia futura, leva em conta o conjunto de fatores que se enquadram na agenda de sustentabilidade. É o caso de eventuais mudanças de regulação com relação à exigência de requisitos ambientais ou mudança de comportamento do consumidor em relação às características de um produto. Esse tipo de avaliação tem que estar no monitoramento constante do management. O papel do Conselho é ter a certeza que a diretoria executiva faça a conexão com a estratégia e o mapeamento adequado de riscos e informe o Conselho.
Boardwise: As discussões a respeito do clima parecem estar mais avançadas, incluindo a taxonomia. Como enxerga os avanços até agora?
Clarissa Lins: Essa tem sido uma temática de discussão em diversos Conselhos, sobretudo os de empresas muito impactadas pela mudança do clima ou cujas atividades têm um impacto relevante em emissões de gases de efeito estufa. As discussões não são necessariamente uniformes em todos os setores.
Boardwise: O que ainda falta evoluir sob o aspecto climático?
Clarissa Lins: A regulação ainda precisa avançar de uma maneira mais homogênea em diferentes geografias. A taxonomia europeia é mais exigente. A SEC acabou de lançar diretrizes de divulgação em relação ao clima e deu uma pausa, porque o tema estava sendo judicializado. No Brasil, a CVM também replica alguns padrões globais. Para empresas que operam em várias geografias, é fundamental que essas taxonomias se falem, para que não tenhamos esforço desnecessário em diferentes regiões do mundo. As empresas precisam ter mais clareza de que as mudanças climáticas são a chave para aferir o sucesso de suas estratégias de longo prazo.
Boardwise: Como avalia a preocupação dos Conselhos sobre a transição energética?
Clarissa Lins: Depende do setor da atuação da cada empresa, se está mais exposta aos riscos e às oportunidades que a transição apresenta, da geografia, das exigências de acionistas, órgãos reguladores, da sociedade ou financiadores. Em algumas áreas estamos bastante avançados, os Conselhos têm contribuído muito. Outras, onde políticas públicas estão muito atrasadas, o Conselho se depara com um ambiente não necessariamente propício. É uma avenida que depende de vários fatores. O avanço depende do setor, do desenvolvimento de uma tecnologia, de um produto que atenda a uma exigência de baixo carbono, do cumprimento de regulação mais exigente.
Boardwise: E em que estágio as companhias no Brasil se encontram quanto a este tema?
Clarissa Lins: As grandes companhias listadas no Brasil estão sujeitas a um nível de escrutínio maior. Nelas, os processos para identificar o impacto das mudanças climáticas estão bem definidos. Pelo menos, já se sabe o que fazer. O ritmo vai depender muito do nível de exigência dos acionistas. O que ainda falta, talvez, é uma avaliação de riscos físicos. Empresas que operam majoritariamente no Brasil, que também sofre impacto de eventos climáticos extremos, como secas, enchentes, tempestades e incêndios, conseguem identificar atividades diretamente afetadas. E, aos poucos, conseguem incorporar isso em suas rotinas operacionais e sua avaliação de risco. Eu diria que isso ainda não é feito de uma maneira consistente, em todos os setores, em todas as empresas. Obviamente, aquelas que estão sendo impactadas estão avançando mais rapidamente.
Boardwise: O cumprimento de metas de transição energética não é muito audacioso? Será possível cumpri-las?
Clarissa Lins: O mundo ainda depende 80% de fontes fósseis e o óleo é a fonte primordial na matriz energética. Teríamos que mudar radicalmente este mix quando consideramos o que a ciência indica como “limite seguro” de aumento de temperatura de 1,5 grau Celsius, comparado aos níveis pré-industriais. As fontes fósseis deveriam ser de cerca de 20% e os outros 80%, entre renovável e nuclear. É uma mudança muito radical num espaço de tempo que o mundo nunca fez. Parece muito desafiador e nem todos têm a confiança de que conseguiremos chegar lá. Por outro lado, se o ritmo das mudanças tecnológicas têm sido acelerado, também não conseguimos dizer que não chegaremos lá em 60 anos. Então, em algum momento do tempo, até 2050, tudo indica que a capacidade de inovar e implementar as tecnologias de baixo carbono deve ser acelerada. A alocação de investimento para energias renováveis e de baixo carbono também têm que subir substancialmente e de uma maneira mais bem distribuída, em termos de tecnologia e de geografia. Hoje convivemos com um nível de incerteza muito grande sobre o que conseguiremos fazer em que tempo.
Boardwise: Isso vale também para o Brasil?
Clarissa Lins: No Brasil, o cenário é ligeiramente diferente. Nossa matriz elétrica nos posiciona onde o mundo gostaria de estar daqui a 10 ou 15 anos. Temos uma matriz 48% renovável e uma matriz elétrica mais de 90% renovável. Ainda temos áreas que precisam ser descarbonizadas. Nossas emissões estão relacionadas ao uso da terra, majoritariamente ao desmatamento na Amazônia. Em termos de clima, estamos bem posicionados, o que não significa que iremos manter esse posicionamento excelente para as próximas décadas. Temos que trabalhar para manter esse posicionamento diferenciado e sermos capazes de capturar as oportunidades da transição para uma economia de baixo carbono.
Boardwise: O que significa isso na prática?
Clarissa Lins: Temos que atrair investimento em energia renovável, e sermos capazes de realizar esses investimentos de uma maneira rentável e atraente, manter-nos competitivos para integrar as cadeias globais.Para tudo isso, é necessário um ambiente regulatório estável, previsível, saudável, que não feche a economia, que não dê subsídio artificiais. Há muita coisa para se fazer.
Boardwise: Considerando os aspectos ESG, o que precisa ser aprimorado no Brasil?
Clarissa Lins: O Brasil tem vantagens comparativas e competitivas claras. Porém, ainda temos muitos desafios na questão social. Neste ponto, há lacunas a serem supridas em termos de igualdade social, além de toda a questão da educação, que é a base para que possamos aumentar nossa produtividade no longo prazo e termos uma inserção mais produtiva nas cadeias globais.
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