Artigo 20/03/2024

Interferência política na Vale e na Petrobras: reputação em jogo

Por Simone Monteiro

Por vias diferentes, a governança da Vale e da Petrobras foi aprimorada ao longo dos anos. No entanto, a recente intensificação da interferência política nas duas maiores empresas do Brasil vem testando estes mecanismos. O assunto é amplamente debatido pela imprensa e pelos fóruns de governança.

E o papel dos conselheiros em meio às crises causadas nas companhias? Ficou praticamente restrito às salas de reunião.. As informações públicas são limitadas e, sem um plano de comunicação, os stakeholders são tão ou mais prejudicados do que a reputação das companhias.

Na Vale, uma empresa privada sem controlador definido, o governo tentou emplacar o nome do ex-ministro Guido Mantega como principal executivo da empresa. Esse foi ponto alto das preocupações sobre a governança da companhia. Mesmo depois que essa ideia ficou para trás, as discussões sobre a sucessão do CEO continuaram causando desconforto dentro e fora da companhia.

A situação da mineradora levou à renúncia de José Luciano Duarte Penido. O conselheiro independente denunciou que o processo de sucessão de Eduardo Bartolomeo tem sido “conduzido de forma manipulada, não atende ao melhor interesse da empresa, e sofre evidente e nefasta influência política“. A decisão foi comunicada em carta e nada mais. Do restante do Conselho, não se ouviu nenhuma palavra, nem antes nem depois da companhia informar que o presidente atual permanecerá na companhia até o fim do ano.

Na Petrobras, a crise mais recente envolveu o corte do pagamento dos dividendos extraordinários a pedido do presidente Lula. Uma decisão que, sabemos, deveria ser tomada pelos gestores da empresa, com base em critérios técnicos. Com essa notícia, em um único dia, as ações da petroleira caíram 10%, resultando em perdas de R$ 56 bilhões na bolsa.

A ingerência política não é novidade na estatal, que sofreu com o escândalo da Lava Jato e desde então vem tentando recuperar sua imagem. Mesmo depois disso, a petroleira não saiu ilesa da interferência de políticos de diferentes governos. Assim como na Vale, muito pouco ou quase nada se ouviu dos Conselhos desde então.

E o que os conselheiros têm a ver com isso? O Conselho é o guardião da governança e deveria, de alguma forma, demonstrar que está fazendo o seu trabalho. No momento de crise, confirmar que esta tarefa está sendo bem conduzida é o mínimo que se espera da mais alta administração de uma empresa. Sem uma palavra que garanta essa eficácia, os problemas se intensificam e a confiança fica abalada. A recuperação da reputação é muito mais trabalhosa do que construí-la.