A governança e a perenidade das companhias
Por Simone Monteiro
O mundo atual muda cada vez mais rápido, e as empresas precisam se adaptar aos novos tempos. O público consumidor cada vez mais exigente, o avanço de novas tecnologias e a transição energética são apenas alguns dos temas que merecem atenção das companhias, sejam elas grandes ou pequenas. Nos dias de hoje, um erro pode ser fatal, e as decisões precisam ser certeiras, com impactos não só no curto, mas também no longo prazo. Afinal de contas, a perpetuidade dos negócios está em jogo.
Diante de tanta complexidade, não existe resposta exata ou uma fórmula certeira para o sucesso. Empresas bem preparadas tendem a sair na frente, isso todo mundo já sabe, mas qual seria esse diferencial? A resposta depende de múltiplos fatores relacionados ao próprio negócio. Mas um detalhe relevante pode fazer uma completa diferença na jornada das empresas.
Existe um pano de fundo básico, que deveria ser adotado pelos negócios de forma geral. Trata-se da governança corporativa, algo tão importante que foi incluído nas três letrinhas que compõem o ESG (sigla em inglês para os critérios ambientais, sociais e de governança, na sigla em inglês).
O ESG ficou muito em voga no cenário pós-pandemia e fala-se principalmente do S e do E. A impressão que se tem é que a governança, muitas vezes, passa despercebida, o que me leva a pensar se evoluímos o suficiente. Afinal de contas, as discussões sobre o tema não são novas. Seria a governança apenas uma palavra bonita para compor relatórios de empresas? A governança é, ou pelo menos deveria ser, o pilar básico de qualquer companhia. Mas, no Brasil, o processo ainda é longo, como lembra o investidor e conselheiro Gueitiro Genso.
Há, no entanto, boas notícias. A Faria Lima, coração do mercado financeiro brasileiro, finalmente começa a se atentar que a governança não é apenas um acessório. Se uma empresa, mesmo de menor porte, deseja se financiar por meio de uma emissão de debênture ou de um certificado de recebível imobiliário ou do agronegócio, por exemplo, este critério pode e deve fazer parte do checklist dos investidores.
Obviamente, não é o único fator para uma decisão de investimento, mas sem uma estrutura de governança adequada, o investidor começa a cobrar um preço, literalmente.
“Temos um desafio como sociedade e país, de fazer uma educação empresarial. Estamos melhorando a qualidade das informações das companhias e aumentando a competitividade”, disse Genso, na aula online sobre “O Brasil em 2024: Oportunidades e Desafios”, da FIA, com apoio da Ânima Comunicação em Governança.
Quando se fala em grandes corporações, o tema é tratado há muito mais tempo. Mas não há dúvidas que elas também têm um dever de casa a ser feito quando se fala em governança corporativa. Não à toa, de tempos em tempos, eclode no Brasil um escândalo de governança corporativa - e o tema volta às manchetes dos jornais.
Gueitiro esteve na sala dos Conselhos de algumas das principais empresas do país e sabe dessa necessidade na prática. Um exemplo é a composição dos conselhos. “Quando você está organizando, por exemplo, uma chapa ou um grupo de conselheiros para propor a candidatura em uma assembleia, o normal seria que aquele conjunto representasse competências complementares”, afirma.
A tão falada diversidade dos conselhos deveria ser um mosaico que reflete pelo menos a base de clientes da companhia - de forma geral isso ainda não acontece. Sabemos que a maioria dos boards é formada por homens brancos, com idade média de 55 anos e uma formação que se restringe a engenharia, finanças, administração e direito.
“O Brasil é diverso, e isso está melhorando, mas não na velocidade que precisamos para que as companhias possam receber mais recursos pelo valor adequado”, completa. Gueitiro é enfático: sem governança, o preço será cobrado.
A governança está diretamente ligada à perenidade das companhias e o papel dos conselhos de administração é crucial. São esses colegiados que vão dar as diretrizes para os grandes passos do negócio, com foco no futuro. A transição energética é um dos temas que passa pela estratégia de diversas corporações locais. “O segmento traz muitas oportunidades do Brasil, temos de aproveitá-las e trazer capital. Tem muita gente interessada em vir e explorar nossas potencialidades”, diz a economista e diretora do BNDES, Helena Tenorio Veiga de Almeida.
Outro ponto-chave é a transformação digital. Quando se fala em inteligência artificial, a governança de dados é fundamental. Se os dados não forem confiáveis ou transparentes e com pessoas responsáveis por alimentá-los, a IA pode criar problemas ou, no mínimo, criar vieses.
É a grande mão dos conselhos que vai definir essas diretrizes para que a administração das companhias possa executá-las. E, acima de tudo, o conselho deve supervisionar este trabalho. A governança deve perpassar todas as esferas de uma empresa, de cima a baixo. Mais do que um relatório com imagens bonitas, deve fazer efetivamente parte da cultura de uma empresa. Quando isso acontece, certamente, contribuirá para a reputação, transparência e perenidade do negócio.